Quis ustodiet ipsos custodes?
- Alison Franca
- 15 de jul. de 2015
- 4 min de leitura

There are many here among us who feel that life is but a joke. All along the watchtower, princes kept the view While all the women came and went […]
(All along the Watchower, Bob Dylan)
Watchmen é um livro de história em quadrinhos, escrito por Alan Moore e ilustrado por Dave Gibbons. A sua publicação ocorreu em doze edições mensais, pela editora DC Comics, nos Estados Unidos, entre 1986 e 1987.
O livro ganhou uma repercussão mundial e é tão aclamado quanto A Queda de Murdock e The dark Knight Returns, de Frank Miller e Maus, de Art Spiegelman. Além disso, Watchmen foi a única história em quadrinhos que entrou para a lista dos 100 melhores romances, eleito pela revista Time.
A princípio, a história é narrada pelo personagem Rorschach, por meio de uma página de diário. Nas falas iniciais, percebe-se que ele faz uso constante de adjetivos para descrever o que está acontecendo na cidade e, também, expor sua opinião perante o mundo. O personagem demonstra certo conservadorismo e personalidade forte:
Diário de Rorschach. 12 de outubro de 1985: Carcaça de cão morto no beco hoje de manhã com marcas de pneu no ventre rasgado. A cidade tem medo de mim. Eu vi sua verdadeira face. As ruas são sarjetas dilatadas cheias de sangue e, quando os bueiros transbordarem, todos os vermes vão se afogar. A imundície de todo sexo e matanças vai espumar até a cintura e os políticos e as putas vão olhar para cima gritando “salve-nos”...Eles tiveram escolha. Todos. Podiam ter seguido os passos de homens honrados como meu pai ou o presidente Truman. Homens decentes, que acreditavam no suor do trabalho honesto. Mas seguiram os excrementos de devassos e comunistas sem perceber que a trilha levava a um precipício até ser tarde demais. E não me digam que não tiveram escolha. Agora o mundo todo está na beira do abismo contemplando o inferno e os liberais, intelectuais e sedutores de fala macia... De repente não sabem mais o que dizer.
(MOORE, 2011, p.1).
O mistério a ser desvendado é a morte de Edward Blake, conhecido como Comediante. Rorschach acredita que alguém está assassinando alguns heróis, mas não consegue descobrir o real motivo. Diante dessas mortes, ele procura alguns ex-companheiros para alertar sobre os assassinatos, pois todos devem estar atentos ao ocorrido.
Aparecem no enredo outros herois, como Coruja, Ozymandias (considerado o homem mais inteligente do mundo e dono de um grande império), Espectral e Dr. Manhattan. Este é o único que possui super-poderes, pois foi desintegrado acidentalmente em uma experiência, pois era cientista nuclear. Quando voltou à vida, por meio da reintegração de moléculas do seu corpo, estava dotado de poderes especiais, entre eles: manipular a matéria, viajar para outras galáxias, estar em lugares distintos ao mesmo tempo e ver seu próprio passado e futuro. Manhattan tem uma figura importante na obra e é considerado um deus devido aos seus vastos poderes.
Quando todos pensam que o único problema é apenas os assassinatos dos herois, Ozymandias aparece e encaminha o enredo para um desfecho surpreendente. Vão surgindo questões políticas durante o enredo e notamos que Watchmen vai muito além daquilo que parece ser: não é apenas uma preocupação com mortes misteriosas.

Segundo Moore, Watchmen é um “estudo do poder”, pois esta é a visão que nos remete aos super-herois, estejam estes sozinhos ou em grupos. Quando pensamos em super-herois, imaginamos um ser poderoso, dotado de força e de inteligência. Entretanto, o poder não se resume necessariamente em força física, mas, também, manifesta-se em outras formas, como política, estatal ou até mesmo religiosa. O poder é uma personificação, é um ser inanimado, não tocamos, não vemos em sentido literal, porém podemos senti-lo e vivenciá-lo diuturnamente.
O poder do Dr. Manhattan não está somente em seus super-poderes, mas na influência política que ele passou a exercer após vencer a Guerra do Vietnã, que causou interesses militares dos Estados Unidos. A obra pode ser considerada uma parábola da Guerra Fria, esta que culminou a Corrida Armamentista entre Estados Unidos e União Soviética. Seria, então, o Dr. Manhattan uma metáfora, uma representação do poder militar ou alguém que pode defender seu país? O que poderia fazer um indivíduo que detém o poder de controlar os átomos e manipular qualquer matéria? Seria ele a representação de um poder que pode modificar o meio ou toda a sociedade?
Para também representar esse poder, Moore utilizou no livro a frase "who watches the watchmen?", traduzido da expressão latina quis ustodiet ipsos custodes? Significa “quem vigia os vigilantes?” e seu surgimento foi em Roma com o poeta Juvenal. Na época, algumas pessoas utilizavam o termo para tratar de questões políticas, como a separação dos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário e como seria a relação entre eles. A expressão tornou-se universal e além de ser citada por Platão, em A República, é utilizada para tratar de assuntos sobre política e como agem os governos opressores.
Em Watchmen não se sabe exatamente quem pode vigiar esses vigilantes, mas o autor nos dá uma noção dos poderes que os herois detêm e o que realmente podem fazer com a sociedade. Apesar do ano de publicação ser de 1987, a obra torna-se algo atemporal e segue em nosso cotidiano, porém nossos vigilantes não cobrem seus corpos e suas faces com tecidos de super-herois. Algumas metáforas estão mais disfarçadas que outras. Questões sobre poder e política sempre estarão atreladas ao ser humano.
Enquanto não descubro quem são os vigilantes e quem pode protegê-los, começo a caminhada me protegendo de mim mesmo.
Bibliografia
MOORE, Alan. Watchmen. 2ª Ed. Barueri, São Paulo: Panini Books, 2011.
https://www.youtube.com/watch?v=qKebCtCTbCA&feature=youtu.be
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